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2004/06/04

Eu vou, eu vou, eu vou ao Rock in Rio eu vou (*) 

Começa amanhã o segundo (e último) fim de semana do famigerado Rock in Rio. No primeiro fim de semana, segundo o Público, ao invés das 300.000 pessoas esperadas (seria melhor dizer antes “desejadas”) pela organização, passaram por lá apenas 140.700 pessoas, ou seja menos de 50.000 pessoas por dia. Ainda assim, a organização do Rock in Rio está optimista pois conta com Sting como trunfo para levar uma grande enchente ao recinto.

Quando vejo que o número de espectadores não chegou sequer aos 50.000 dá me vontade de perguntar para quê tanto barulho, tanta cobertura mediática e tantas medidas de segurança (incluindo exclusão temporária do espaço Schengen)... Afinal de contas, há coisa de 10 anos os Pink Floyd encheram por 2 noites consecutivas o antigo estádio de Alvalade com mais de 60.000 pessoas em cada noite, e nessa altura não houve nada que se comparasse com este circo mediático Rock-in-Rioense, nem transportes públicos com horários especiais, nem medidas de segurança excepcionais, nem nada disso. E o que é certo é que esgotou!... Na altura lembro-me que nunca tinha visto tanta gente junta num espaço tão pequeno...

Quanto ao festival em si, desde o seu anúncio que me admiro com a estratégia de marketing seguida pela organização. E convenhamos que é uma estratégia no mínimo arrojada: no fundo trata-se de vender um festival de rock às pessoas que não vão, por regra, a festivais de rock. Esta estratégia justifica todos os truques de marketing usados na sua promoção: gala de apresentação, convidados vip borlistas, promoção por artistas de telenovela brasileira, saturação de anúncios com a Sílvia Alberto, projecto social por um mundo melhor etc, etc, etc...

Isto para não falar do mais importante, que é o cartaz feito de nomes pouco usuais nos circuitos festivaleiros tradicionais. Repare-se nas cabeças de cartaz: tirando um ou outro, como Ben Harper, Foo Fighters ou Incubus, certamente que ninguém imaginaria Paul Mcartney, Peter Gabriel, Britney Spears, , Sting ou Daniela Mercury num Sudoeste ou num Paredes de Coura...

Porque no fundo, esta estratégia, se é arrojada, tem também um lado muito doce que convém não esquecer: ao vender o festival àqueles que nunca compram festivais, de facto o Rock in Rio não encontra concorrência em nenhum dos outros festivais, a começar por exemplo pelo seguinte, o Super Bock Super Rock. Num ano de crise e em que há excesso de oferta no mercado da música ao vivo, não parece nada mal visto ir buscar recursos a um nicho de mercado ainda por explorar... tudo como mandam os “case studies” da Harvard Business Review...

Aliás, é muito curioso assistir à polarização que se dá entre os dois festivais, pois ao Super Bock tenderão a ir as pessoas que ostentam o orgulho de NÃO ir ao Rock in Rio, e que estão entusiasmadas com as actuações de Pixies, Massive Attack, Muse ou NERD... Não estranharia se um inquérito aos espectadores do Super Bock revelasse que na sua maioria são frequentadores assíduos de festivais e concertos... claro, pois o cartaz (tirando uma Avril Lavigne e um Lenny Kravitz ou outro) foi feito à sua medida...

Estaria tudo muito certo, não fosse o carácter pernicioso e irritante que revestiu a promoção do Rock in Rio. Afinal de contas, sempre que se falava no festival, lá vinha o inevitável “Por um mundo melhor”. Dificilmente poderiam ter arranjado algo de mais hipócrita para promover o produto em causa. Afinal de contas, fazem-se 3 minutos de silêncio acenando com lenços brancos quando, curiosamente, estes estão decorados com cerca de 20 logótipos de patrocinadores diferentes, todos grandes empresas. Ou atribui-se uma parte do dinheiro dos bilhetes ao projecto social, mas depois dá-se uma tenda vip aos convidados do social, e podemos ver o Sr. Castelo Branco (mas que raio é que esse senhor faz num festival de rock, alguém me explica?) a dar nota 20 ao catering da tenda vip, por onde outros borlistas se exibiam para as cameras com os seus whiskies à conta da casa... Agora digam lá: se houvesse realmente um projecto social não seria melhor tirar ao Sr. Castelo Branco o seu catering nota 20, deixá-lo em casa, e dar o dinheiro que se está a gastar com ele e outros da sua laia a quem realmente precisa? Isso sim seria “Por um mundo melhor...”

Constou-me por uma pessoa que conhece uma pessoa que conhece uma pessoa ligada à organização (ou seja, isto é uma total suposição) que o break-even do festival estaria nos 300.000 espectadores. Com tantos patrocínios, parece-me um número de espectadores muito elevado para chegar ao break-even, mas na verdade não faço ideia dos custos envolvidos num projecto destes... A ser verdade, fico feliz por saber que quem não vai ter “Um mundo melhor” será a conta bancária do Sr. Medina, pois os lucros do festival acabarão por ficar (tal como o número de espectadores) muito áquem do esperado... afinal de contas acabaria por ser um castigo apropriado para tanto barulho e tanta hipocrisia...

Apesar de estar firme e orgulhosamente alistado no campo do “eu NÃO vou”, desejo que quem for se divirta muito, e que os concertos sejam de facto muito bons. É que, afinal de contas, 53 Euros por dia é muito dinheiro para se gastar se não for para se tirar bom partido dele. Mas já agora, que o Sr. Castelo Branco e os seus amigos borlistas não se divirtam muito e que o catering não lhes caia bem no estômago... pois para além de não terem lá lugar, a sua presença é um insulto ao espírito dos festivais de rock que celebravam de facto o desejo de mundo melhor, como por exemplo aquele mítico de há 35 anos, em Woodstock... (esse se não era por um mundo melhor, era pelo menos por um mundo com drogas melhores...)

(*) ler em tom de falsete, num ritmo à sete anões da branca de neve...



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